Câmara realiza a primeira audiência para discutir a Lei de Uso e Ocupação do Solo

Fotos Samuel Junio Tomaz

Plenário, galeria e hall lotados. Dessa forma, aconteceu, na noite de quarta-feira, 23/10, a primeira das duas audiências públicas da Câmara Municipal de Contagem que vão debater o Projeto de Lei Complementar 019/19, a chamada Lei de Parcelamento, Ocupação e Uso do Solo (LPOUS).

Iniciada e comandada pelo presidente da Comissão Especial de Análise do PLC 019/19 da Câmara, vereador Alex Chiodi (SD), a audiência foi marcada por muita discussão e exaltação por parte da plateia, que era dividida entre cidadãos comuns, servidores da administração municipal, associações, movimentos sociais e ambientalistas, como o SOS Vargem das Flores, a Associação de Proteção e Defesa das Águas da Vargem das Flores, e a Apua – Associação dos Protetores, Usuários e Amigos da Represa Vargem das Flores.

A primeira parte da audiência foi reservada para a exposição do Executivo. O secretário municipal de Desenvolvimento Urbano e Habitação, Ivayr Soalheiro, mostrou de forma pontual as principais alterações que a proposta da Lei de Parcelamento, Ocupação e Uso do Solo trazem em relação à LPOUS vigente, que é do ano de 2010.

Segundo o secretário, cuja pasta é a principal responsável pela elaboração do PLC 019/19, a LPOUS vigente contém disparidades e dubiedades que são corrigidas pela nova proposta. “Estamos simplificando a Lei para o fácil entendimento, tanto de técnicos, quanto do cidadão comum. O novo texto tira subjetividades, pois a LPOUS atual tem muita dubiedade e a população, com isso, muitas vezes sofre com as várias interpretações que o texto possibilita. Dessa forma, garantiremos que o cidadão comum conseguirá se orientar pelo novo texto da Lei”, explicou Ivayr.

Outro aspecto que avança na nova legislação proposta, de acordo com o secretário, é a regularização dos distritos industriais existentes na cidade, cujas empresas funcionam com alvarás provisórios por causa da lei atual. O resultado disso é, segundo Ivayr, a insegurança de investimento por parte das grandes empresas que geram receita e tributos para o Município. “Acabaremos com a incompatibilidade para o setor industrial, sem que isso signifique a extinção das obrigatórias compensações ambientais e urbanísticas das empresas”, garantiu.

De acordo com o secretário, houve também avanço nas regras de uso do solo e, com isso, muitas dificuldades enfrentadas pelos Microempreendedores Individuais (MEI) devem ser solucionadas com a aprovação da nova LPOUS. Um exemplo dado foi a facilitação do alvará de funcionamento e a possibilidade do endereço fiscal – quando o endereço de cadastro no sistema do MEI é um, podendo ser a residência do microempreendedor, mas o local do exercício da atividade é outro. Além disso, traz a flexibilização das regras de instalação de atividades econômicas nas residências, possibilitando a obtenção de renda sem o deslocamento.

Polêmica

O ponto de tensão do projeto é a região da Bacia de Vargem das Flores, que ocupa 54% do território do município.  A represa, denominada Sistema Vargem das Flores, está localizada entre os municípios de Betim e Contagem e é uma importante fonte de abastecimento de água da Região Metropolitana de Belo Horizonte.

De forma conclusiva, o posicionamento do Executivo foi de que a nova LPOUS não altera em nada o que o Plano Diretor da cidade já determina para a região da lagoa. O documento aprovado em 2017 pela Câmara, no entanto e dentre outras coisas, extingue a zona rural da cidade e a transforma em ZEU3 – Zona de Expansão Urbana 3. Também permite no entorno imediato da lagoa – área classificada como ZEITE (Zona de Especial Interesse Turístico) – a cotização dos lotes de 10 mil metros em cinco partes.

Por isso, o argumento da Secretaria de Desenvolvimento Urbano foi alvo de muitas críticas ao longo da audiência, principalmente pelos participantes inscritos da plateia. A maioria das falas foram em tom de protesto contra o que muitos chamaram de negligência em relação à preservação ambiental de Vargem das Flores.

Cristina Maria de Oliveira, integrante do Conselho Municipal de Política Urbana (Compur) e do movimento SOS Vargem das Flores, por exemplo, criticou tanto o Plano diretor de 2017, quanto a LPOUS proposta agora pelo Executivo. Em sua análise, o novo texto permite a urbanização da região de Vargem das Flores que, em 50 anos, teria cerca de 900 mil moradores, caso a legislação se mantenha. Cristina citou também um estudo encomendado pela Copasa – cuja ausência na audiência e a atuação como protetora da Vargem das Flores foi questionada em vários momentos – que indica que, se a lei for aplicada como está, o reservatório de Vargem das Flores estaria assoreado e seco em 23 anos.

Parlamentares insatisfeitos

Os vereadores Dr. Wellington Ortopedista (PDT) e Daniel do Irineu (PP) pediram a palavra para expressar a insatisfação com o espaço em que a audiência acontecia. Para eles, o fato de várias pessoas terem ficado sem acesso ao plenário, devido à lotação, diminuiu o caráter democrático da audiência. Ambos se retiraram antes da metade do evento, em sinal de protesto. A atitude foi criticada por Alex Chiodi e pela vereadora Silvinha Dudu, além de outros oradores da plateia.

Daniel do Irineu chegou a sugerir, inclusive, que a audiência fosse invalidada e remarcada para outro espaço público. Outra reivindicação do vereador foi a consultoria externa e independente, solicitada por ele e aprovada pelos outros vereadores, e que ainda não aconteceu e que, segundo ele, serviria para munir os vereadores de informações para que eles possam, de forma consciente, analisar e propor mudanças ao projeto.

·  Vereador Dr. Rubens Campos apresenta emendas ao projeto em cartilha distribuída no evento

Em contraponto, o vereador Dr. Rubens Campos, que distribuiu para os presentes uma cartilha contendo suas 42 emendas ao texto original vindo do Executivo, viu com bons olhos a superlotação. “Ainda bem que a Câmara está lotada e tem gente lá fora. É bom assim (…), então, na próxima, podemos arrumar um local maior e mais adequado”, afirmou Dr. Rubens,  acrescentando que apesar dos inconvenientes causados aos populares, há de se comemorar a participação. “Esse é um debate que é de interesse da cidade, por isso veio tanta gente”, reiterou.

Segundo o parlamentar, as propostas apresentadas na cartilha, foram construídas após “amplo debate” com “diversos segmentos e setores” da cidade. Ele salientou que este é o momento de debate, de apresentar propostas e opiniões de forma que o projeto seja aperfeiçoado. “Da forma como está atualmente o projeto, o Mandato de Unidade Popular Rubens Campos vai votar contra. Por isso, apresentamos 42 emendas ao projeto, construídas com muito estudo e debatidas com vários segmentos da cidade”, salientou Dr Rubens, concordando que a  pauta de Vargem das Flores é prioridade na discussão do projeto de Lei e, inclusive, sendo a “primeira e principal emenda” apresentada por ele. “A partir dessa primeira emenda que apresentamos, que defende a volta das Zonas Rurais no município, poderemos definir qual tipo de ocupação teremos em Vargem das Flores e quais serão as prioridades de nossa cidade”, justificou.

Esta foi a primeira de duas audiências para debater o projeto de Uso e Ocupação do Solo, a próxima ocorrerá na próxima quinta-feira, dia 31 de outubro. Este é o momento, segundo Dr. Rubens, dos vereadores e da sociedade, dialogarem e discutirem o futuro da cidade. “Com projeto modificado estamos dispostos a colaborar para que possamos aprovar uma lei racional, que facilite o crescimento econômico da cidade, que preserve o meio ambiente, não apenas de Vargem das Flores. Esperamos que as audiências públicas contribuam para construir uma alternativa ao projeto atual”, concluiu o vereador Dr. Rubens Campos.

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