Coluna Mulher – 23.06.2024 – Pl do estupro: estejamos atentas e fortes!

Viviane França(*)

Quando comecei a faculdade de direito, em meados do ano de 2007, uma das minhas matérias preferidas era o direito penal. Minha monografia de conclusão de curso foi exatamente nessa disciplina. Mas o fascínio com o direito penal foi justamente porque por meio dele passei a compreender melhor como o pacto Estado/Cidadão só era possível de ser garantido com a normatização de condutas e as garantias básicas como a liberdade e o direito à justiça.

Como mulher, universitária e, na época, com um conhecimento prematuro da legislação brasileira, tinha a convicção que o estupro era um dos crimes mais cruéis cometido contra as mulheres. Isso por um pensamento racional de que a morte coloca o fim em todas as coisas. Acabou e ponto final: não existe memória ou relato. Mas o estupro não. O estupro viola não apenas o nosso corpo, mas a nossa memória futura,  os nossos planos, a nossa essência: nossas subjetividades, ele não acaba com a consumação do crime. O crime é só o começo do sentimento de impotência, do que poderia ter sido se não tivesse ocorrido.

Não faço parte das estatísticas dessa agressão, mas inúmeras de nós fazem e nenhuma está livre de fazê-lo,  não importa a idade ou condição social.

Com esse sentimento que eu assisti estarrecida a aprovação do regime de urgência para a tramitação do Projeto de Lei 1904/2024 que equipara o aborto de feto com idade gestacional igual ou superior a 22 semanas ao crime de homicídio para efeitos penais, inclusive nos casos onde o aborto é permitido por lei, como o estupro. A pena para o aborto nas condições do PL se equipararia ao homicídio. Os profissionais da saúde que realizarem o procedimento também serão criminalizados.

O projeto de lei não significa apenas um retrocesso a todos os direitos conquistados pelas mulheres até aqui, como a própria possibilidade de realizar um aborto, nos casos de estupro ou nos casos em que a gravidez coloca em risco a vida da gestante, direitos adquiridos desde 1940. Mas, ignora completamente a mulher como uma pessoa humana de direitos. E também destaca a ineficiência do Estado em garantir a liberdade da Mulher, e o direito dela transitar e viver sem ser agredida, sem ser estuprada. Reposiciona o Brasil em 1939, quando a mulher era vista como um objeto.

O aborto nos casos de estupro como está regulamentado, atende as mulheres, funciona, não precisa ser mudado e, não condiciona em quanto tempo precisa ser realizado por questões obvias. O tempo de uma mulher violada sexualmente não é o tempo das pessoas que fugiram às estatísticas criminais. Junto a violação sexual está a completa desorientação psicológica da sua condição no mundo. O Estado falhou no pacto social de protegê-la. E a família também.

O aborto legal não é um direito conquistado para quem transa sem se prevenir. Para isso temos métodos contraceptivos legais. O aborto legal é uma garantia a mulheres que foram violadas ou que estão com a vida em risco.

Que fique claro: o PL do Estupro possuiu um recorte claro de classe e aponta para aprofundar a segregação social, pois criminalizará mulheres pobres, pretas e os profissionais da saúde pública.

O suspiro de alento diante da tragédia declarada pelo PL do Estupro está na reação da sociedade brasileira. Pesquisa divulgada no dia 20/06 aponta que 2 em cada 3 brasileiros são contra o projeto de lei. A reação popular que ultrapassa todas as barreiras políticas, ideológicas ou religiosas: 66% da população é contra o PL; entre os evangélicos 57% e 68% entre os católicos. A unidade e a resistência das mulheres demonstra que lutar vale a pena, pois obtivemos uma vitória importante: o Presidente da Câmara dos Deputados foi obrigado a recuar na tramitação acelerada do PL.

Sigamos atentas e fortes!

(*)Viviane França: mulher, Advogada, Pesquisadora, Mestre em Direito Público, Especialista em Ciências Penais, autora do livro Democracia Participativa e Planejamento Estatal: o exemplo do plano plurianual no município de Contagem. Secretária de Defesa Social de Contagem/MG, Sócia do França e Grossi Advogados.

COLUNA EDUCAÇÃO – 16.06.2024 – A escola que eu quero

Por Wania Emerich Burmester – Mestre em Psicologia da Educação com ênfase na Ciência Cognitiva e Especialista Pedagógica do Sistema Positivo de Ensino
Em uma sociedade tão diversa como a que estamos inseridos, pensar em inclusão na escola é assunto urgente, necessário e inegável. Historicamente falando parece que não conseguimos exercitar nosso olhar para o diferente, para o outro que não se adequasse a padrões pré-estabelecidos com “normais”, convencionais. Pessoas que trazem em suas características físicas ou fisiológicas ou emocionais atípicas, sempre foram levadas a um lugar de exclusão, segregação.
Quando educamos as crianças e adolescentes, o grande desafio é torná-los capazes o suficiente para viver em sociedade, com autonomia. E como fazer isso com todas as particularidades, peculiaridades referentes a condição de cada um?
Penso que a escola, enquanto instituição formal, tem como objetivo primordial, ENSINAR. Ensinar não quer dizer ensinar alguns, nem apresentar conteúdos de determinada forma e cada aluno que se organize para aprender. Ensinar é oportunizar uma diversidade de meios pelos quais todos os alunos atinjam a aprendizagem. O professor precisar buscar os melhores recursos para atingir seu objetivo. Mesmo que precise trazer recursos diferentes para o mesmo assunto.

Paremos para refletir um pouco:
Imaginem se um médico tivesse como objetivo curar só alguns pacientes. Como ficariam os outros? Imaginem um engenheiro civil que tenha como objetivo que só alguns de seus projetos sejam sólidos e permaneçam em pé. Como ficariam os outros?

Tomemos agora o exemplo do professor:
O papel do professor é o de encantar seus alunos, é criar possibilidades de aprendizagem, é verificar se seus alunos aprenderam para, se necessário, criar novos recursos (e) para garantir que todos aprendam de forma saudável, feliz e significativa.
Portanto, o trabalho do professor e papel da escola são coerentes na medida em que trabalham sob a perspectiva inclusiva. Falar em PEI, adaptações, sala de recursos é reforçar a demanda de que todos merecem uma aprendizagem carregada de sentido.
Fico me perguntando, por que alguém que escolhe ser professor, fica questionando a necessidade de adaptar o material para determinado aluno. Escolher ensinar e não se propor a ver o brilho nos olhos da aprendizagem acontecendo, se distancia cada vez mais do propósito da educação. O professor que não se debruça sobre as possibilidades para atingir a todos perde a parte mais linda da sua profissão. Perde a mágica que é a transformação que a aprendizagem faz na vida de uma pessoa.
Minha formação inicial já foi em Educação, comecei pelo Magistério, cursei Pedagogia, depois pós-graduações, mestrado e agora o doutorado, sempre acreditando na educação para todos.
Todo professor deixa marcas na vida de seus alunos. As marcas podem ser positivas, aquelas que ao lembrar do professor, imediatamente sorrimos, um calor aconchegante nos toma por completo, são os professores que não mediram esforços para ensinar. Mas também têm aqueles que quando lembramos, sentimos um frio na espinha, sensação de medo, de mal-estar. São aqueles professores que apenas cobraram respostas, que deram nota e não te avaliaram, são aqueles que não caminharam junto. Precisamos escolher quais marcas queremos deixar em nossos alunos.
Sendo assim, pensando em trajetória escolar, em direito a educação para todos, é preciso humanizar nossas relações, olhar para os alunos e ter a sensibilidade de perceber o que eles já sabem e o que precisam aprender. Quais habilidades ainda precisam ser desenvolvidas? E para isso, não precisamos de PEI, nem de atividades adaptadas. Precisamos de bom senso, de responsabilidade e ética.
Receber os alunos sem discriminação, desafiá-los para a buscar mais, acompanhar e estar presente, avaliar de forma justa e verdadeira, isso é ser professor, e para isso, não precisamos de um programa de inclusão, de leis, nem de um monte de protocolos. Precisamos de ação, de atitude , de conhecimento!!
Quando os professores voltarem a ser professores teremos a escola inclusiva que todos sonhamos!

(*)Luzedna Glece

Diretora proprietária do Colégio Avançar/CEIAV- CEIAV; Vice-presidente Câmara da Educação Infantil ACIC. Uma das fundadoras do Unidas Transformando Você. Colunista da Educação do Jornal O Folha. Formação: graduada em Pedagogia com licenciatura em Orientação, Supervisão, Séries Iniciais e Administração Escolar; pós-graduada em Psicopedagogia Clínica, Licenciatura em Magistério e Graduação em Neurociência; palestrante de temas voltados às áreas de Educação, Motivação, Relacionamentos Interpessoal e Intrapessoal; estudiosa com trabalhos reconhecidos sobre o tema Bullying; experiências profissionais: professora das séries iniciais e do curso de pedagogia, coordenadora, orientadora, diretora de redes particulares de ensino, supervisora, orientadora diretora regional do Sistema FIEMG.